terça-feira, 22 de novembro de 2011

O Duplo - Dostoievski



Eu li recentemente O duplo (Editora 34, 240 p.) e curti bastante esse livro. A tragicomédia do Sr. Goliadkin é cheia de momentos impagáveis relacionados à sua incoerente autoimagem e seu relacionamento (psico)patológico com a realidade de um modo geral.


Resumidamente, a história começa com as aventuras do Sr. Goliadkin na tentativa de causar uma boa impressão em um evento na qual não foi convidado. Logo no segundo capítulo, ele encontra um médico - semelhante a um psiquiatra - que recomenda-lhe dar um tempo nas atividades atuais e descansar a mente pois "nosso herói" parece cada vez mais desequilibrado. Ele ignora os avisos do médico e como conseqüência... bem, como conseqüência, temos uma história divertidíssima que é muito mais uma tragédia do que proriamente uma comédia.

A narrativa em si merece um destaque especial. A "voz" do narrador é afetada mas bem original e dentre os livros que eu li do grande Dosta esse é o livro mais engraçado de sua obra. Ainda hoje dou risadas ao lembrar de algumas passagens trágicômicas envolvendo o "nosso herói" Sr. Goliadkin e seu "vil desafeto" Sr. Goliadkin segundo.

Um detalhe que eu achei bem interessante é a proximidade de algumas características psicológicas entre o Sr. Goliadkin e o personagem-narrador de "Memórias do Subsolo". No posfácio de o Duplo, Paulo Bezerra comenta que o jovem Fiódor demonstrava muito interesse em estudar psicopatologias originadas por fatores emocionais. Isso esclarece um pouco a facilidade que Dostoievski tinha em representar ao longo de sua obra de maneira tão perfeita uma galeria tão rica de personagens paranóides e esquizóides.

Enfim, esse é um livro engraçado, que envolve uma brilhante análise psicológica de um certo tipo de dissociação/alienação mental e é recomendável para estudantes e profissionais da psiquiatria, da psicologia e para todos aqueles que gostaram de outras obras de Dostoievski. Aproveitem pra pesquisar pela internet, pois existem muitos sites vendendo esse livro com no mínimo 30% de desconto sobre o preço de capa (uns R$40,00 se eu não me engano). Eu comprei esse livro AQUI e recomendo fortemente a leitura dessa novela singular...

Selva de pedra



Espio pela janela de um apartamento, no alto de um edifício. 
É noite e abro apenas uma fresta que refresque a sala, pois chove muito lá fora. 
Eles estão debaixo de um toldo...
Sinto compaixão pelo estado deles, mas o que eu posso fazer? 
Toda noite vejo alguns deles caçando lixo ou procurando em bando por abrigo. 
Olho agora pros que estão ali. 
Dois deles começam a brigar. 
Boca no pescoço, pescoço na boca. 
Não vejo sangue, mas pode ser a chuva. 
O perdedor foge – do vencedor ou de sua derrota imagética? 
Então explode na rua um grito de surpresa. 
Foi o último de uma vida. 
O motorista do Fox não desacelera nem por curiosidade. 
É só mais uma vítima do acaso e do descaso. 
É só mais um animal morto nesta cruel selva de pedra.

sábado, 3 de setembro de 2011

Sobre Os Irmãos Karamázov


Levei mais ou menos dois meses para ler Os Irmãos Karamázov, mas confesso que "Os Demônios" foi pra mim uma leitura mais instigante e agradável do que OIK.

Contudo, após a leitura dOs Demônios, raras foram as vezes em que eu me lembrei de algo que tivesse chamado a minha atenção durante a leitura deste livro, bem diferente do que tem acontecido com OIK. Eu terminei a leitura dos Karamazov em julho deste ano e de lá pra cá parece que eu continuo fazendo 'releituras' e reflexões constantes sobre este livro.

De vez em quando cai uma ficha sobre como os temas "honra", "moral", "dignidade" "psicologia", "crime", "violência", "cristianismo", "niilismo", dentre outros, foram absurdamente bem trabalhados em termos literários. Quando eu digo em termos literários, eu me refiro a algo que está quase dito pelo autor, mas que só passa a ser dito de fato (dentre algumas interpretações possíveis) pela nossa própria voz.

Por exemplo, na minha interpretação dos Karamazov, cada um dos irmãos Karamazov tem um posicionamente ético-político acerca da moral na sociedade. Por exemplo, Mítia me parece alguém imoral - embora seja honrado e digno; Smerdiakov é alguem amoral - e que erra feio ao pensar que Ivan, cético e intelectual, também fosse amoral; Aliocha, naturalmente, se pauta numa moral cristã, enquanto Ivan, no meu entendimento, TRANSCENDE o conceito de moralidade, numa perspectiva nem moral, amoral ou imoral, cujo único norte é a responsabilidade ética e a dignidade humana alimentada por sua honra pessoal. Acho, inclusive, que esse é o grande legado desse livro: um sutil discurso anti-niilista sobre uma nova proposta filosófica e ideológica de moral, pautada na ética cristã e na dignidade humana que será forjada gradativamente por nossa honra pessoal.

Enfim, pode ser "altas viagem" essa que eu escrevi sobre a questão moral e ética dOs Irmãos Karamázov, e possivelmente Dostoievski não quis dizer exatamente aquilo que nós leitores entendemos que ele disse em suas obras, mas é por possibilitar reflexões preciosas como essas que eu procuro ler os grandes clássicos da Literatura de um modo geral. Nesse sentido, OIK não foi a leitura mais prazerosa que já fiz, mas com certeza é um dos livros que eu mais reli na vida sem precisar tocar novamente em uma página sequer.

Os Irmãos Karámazov e Dostoievski são imprescindíveis!

segunda-feira, 31 de janeiro de 2011

Primeiro segundo terceiro

 
A intenção com esse blog é ser o mais honesto possível em algumas considerações acerca de qualquer coisa. Creio que a discordância é sempre importante, pois é da tensão e do conflito que se fazem os diálogos.
Não tenho religião nem acredito em verdades absolutas, mas acho que as certezas e as convicções são indispensáveis à vida.
Enfim, espero fazer algumas resenhas, resumos e (futuramente) ensaios sobre temas livres, embora no momento o que me motive a blogar sejam as releituras de um modo geral.
Parafraseando Bernardo Soares (heterônimo de Fernando Pessoa), se o que eu deixar escrito no blog puder, relido um dia por outros, entretê-los também na passagem, será bem. Se não o lerem, nem se entretiverem, será bem também.